sábado, 8 de maio de 2010

Minas Gerais: História

Tal como fizera a Espanha em suas colônias do Novo Mundo, ao concentrar seus esforços na busca de metais e pedras preciosas, Portugal também transferiu para o Brasil parte dos recursos destinados às expedições do Oriente, bem mais significativas na época, à procura de ouro. O ciclo de lavagem do ouro no litoral sul se mostrou escasso e não teve exploração contínua. As expedições que partiram de Porto Seguro, no primeiro século da colonização, penetraram mais fundo em terras do interior mas nada chegaram a revelar de jazidas milionárias, nem iniciaram povoamento.

A coroa portuguesa, que conseguira estabelecer a colonização na base da grande lavoura, mesmo assim continuou a incentivar entradas em busca de pedras preciosas e de ouro. Havia dificuldades naturais a vencer, entre elas o acidentado do terreno e a oposição dos índios, principalmente para quem partia do Rio de Janeiro ou de São Paulo. A administração portuguesa apelou então para os paulistas, que tinham maior experiência nas marchas, graças à prática de apresamento de índios. Muitos se dirigiram para o norte através de passagens para o sertão, a exemplo de Fernão Dias Pais, que percorreu largo território, de 1674 a 1681. Mesmo assim, só se confirmaram achados positivos no último decênio do século XVII, possivelmente em 1693. Como costuma ocorrer nas economias de mineração, verificou-se um salto do litoral para o interior, com a criação de um núcleo populacional expressivo, que cresceu rapidamente, bem no centro do que seria o estado de Minas Gerais.

Guerra dos emboabas. Os paulistas viam como inimigos os que chegavam depois deles, brasileiros ou portugueses, aos quais chamavam indiscriminadamente de "emboabas". Não admitiam concorrência nem queriam autoridades que lhes cobrassem tributos ou impusessem ordens. Por conta dessa disputa é que em 1682 Manuel de Borba Gato, que desejava manter a posse das riquezas que encontrara, assassinou em uma emboscada o administrador-geral das minas, Rodrigo Castel-Blanco, enviado da coroa.

Na primeira década do século XVIII, além de protestos contra o monopólio dos açougues, de eventuais escaramuças entre paulistas e portugueses e da nomeação destes últimos para os cargos públicos, o problema se agravava com a chegada de levas cada vez maiores de forasteiros. A construção do Caminho Novo, que ligava as minas com o Rio de Janeiro, aumentou o fluxo, e tornou o atrito inevitável. Houve combates, de resultados indecisos, com acentos de violência nos dois lados. A chegada do governador do Rio de Janeiro não logrou o esperado efeito de paz. Em 1708, como os conflitos aumentassem, o português Manuel Nunes Viana, criador de gado da região do São Francisco, assumiu arbitrariamente o posto de "governador das minas", com o apoio dos emboabas. A vitória emboaba, conseguida à custa de morticínios e atrocidades sem conta, eliminou o privilégio dos paulistas e abriu o garimpo da região a todos.

Capitania de São Paulo e Minas de Ouro. A luta armada foi de 1708 a 1710. Em 1709, foi criada a capitania de São Paulo e Minas de Ouro, passo decisivo para a afirmação da presença portuguesa no Brasil. O ouro atraiu o comércio, feito a princípio notadamente pela Bahia: a preponderância no abastecimento foi mesmo uma das causas dos conflitos em que se envolveram mineradores e alguns dos que pretendiam o monopólio dos gêneros. Como São Paulo era pobre e sem maior interesse, os governantes preferiram permanecer em Minas. Nesse movimento de interiorização, as populações agruparam-se inicialmente no centro, mas logo foram descobertas outras jazidas, no sul, no nordeste (Minas Novas) e no oeste (Paracatu). Tão forte foi o movimento de migração, que o governo de Lisboa chegou a proibir a saída de portugueses, providência que veio a se repetir várias vezes.

Foram então criadas as primeiras vilas. Apesar da presença de agentes fiscais e judiciais, continuaram as disputas, agora entre os principais exploradores e o administrador. A coroa exigia o pagamento do quinto pelas casas de fundição, sistema contra o qual se rebelaram sobretudo os portugueses. As partes concordaram então no estabelecimento de várias outras formas de tributação, como a capitação dos escravos, sistema pelo qual os tributos eram pagos em ouro sobre cada trabalhador empregado nas minas; a cobrança por bateia; ou o compromisso de ser paga a soma anual de trinta arrobas de ouro, a título de imposto.

Havia lutas freqüentes, pois o poder público não conseguira impor-se aos potentados. Antes eram os paulistas que se opunham à autoridade; depois foram os portugueses, pelos mesmos motivos, ou seja, o desejo de realizarem livremente seus negócios, sem observância de leis. Houve diversas revoltas, mas a mais importante foi a de Vila Rica, em 1720, alimentada pelo português Pascoal da Silva Guimarães, cujo chefe ostensivo, Filipe dos Santos, um popular que aderira por idealismo ao movimento, foi enforcado e depois atado à cauda de um cavalo para ser arrastado e feito em pedaços.

A revolta na verdade consistiu numa disputa de proprietários, na maioria portugueses, contra o burocrata que lhes limitava a liberdade. Não havia nenhum aspecto de nacionalismo emancipacionista. Venceu de novo o poder público, no reforço do aparelho administrativo. A repressão, violenta e ilegal, partiu do conde de Assumar, Pedro de Almeida Portugal, que obrigado a defender-se ante a coroa pela arbitrariedade cometida com a execução de Filipe dos Santos, apelou para a necessidade de reprimir a desordem e o clima de rebelião.

Capitania de Minas Gerais. Para reforço da autoridade, foi criada no mesmo ano da revolta de Vila Rica a capitania de Minas Gerais, cujo governo repercutiu em todo o território americano sob domínio português. Era natural a medida. No início do século XVIII, as ligações do centro se faziam sobretudo com o Rio de Janeiro, pelo Caminho Novo, que ligava o sertão ao porto pelo qual se fazia a importação de bens inexistentes no interior e a exportação do ouro. O Caminho Novo transferiu a ligação que existia com São Paulo para o Rio de Janeiro. Os paulistas, derrotados, mudaram-se em grande número para Goiás e Mato Grosso. O vínculo com São Paulo tornou-se cada vez mais frouxo. Entre 1693 e 1720, em menos de trinta anos, a região teve um apreciável povoamento, surgiram vilas e impôs-se a autoridade. Entre Vila Rica, que é o núcleo concentrado, e os demais territórios desbravados, havia o vazio de matas e serras. O processo era portanto bem diferente do que ocorria nas regiões agrícolas, fundadas na ordem e num esforço contínuo e contíguo.

Ouro. A exploração do ouro, principal atividade de Minas Gerais, foi feita de modo precário, aproveitando-se o que se encontrava à superfície (ouro de aluvião). Não houve técnica, recursos ou vontade para esforço proveitoso. Portugal, dominado pela mentalidade mercantilista característica da época, só pensava na riqueza, que usufruía em caráter espoliativo, predatório e não científico. Dava ênfase ao tributo, não à elevação da produtividade por meio de novas técnicas. Nunca enviou um geólogo à região, para estudar as condições do terreno e do trabalho, mas apenas arrecadadores de impostos ou forças policiais para reprimir os levantes de escravos, a animosidade dos índios e a sublevação de portugueses e brasileiros.

A ordem era instável e havia um permanente clima de rebelião. A administração preocupava-se apenas com o melhor modo de arrecadar o quinto, e mudava de forma ao longo dos tempos, de acordo com as pressões episódicas. Segundo o depoimento dos administradores mais lúcidos e dos especialistas, já na fase da decadência, era a pobreza da técnica que levava ao prejuízo. Enquanto o administrador buscava arrecadar, o mineiro tratava de sonegar o que podia de sua produção. Daí a proibição dos ourives, do ouro em pó, o fechamento das saídas, com policiamento mais severo que no resto do Brasil. A atividade, que começara com grandes promessas, logo se revelou insuficiente. A década de 1760 ficou para muitos historiadores como o período inicial da queda, de vez que foi a falta de cumprimento do compromisso das cem arrobas, que acabou por provocar a derrama. Mas há fortes indícios de que o declínio começou bem antes.

Apesar da precariedade das formas de exploração adotadas, foi grande a quantidade de ouro que se obteve, em relação à produção mundial de ouro da época. A riqueza criou uma civilização, que marcou o presente e o futuro, não só de Minas Gerais como de todo o país, contribuindo, assim, para a integração nacional. Seus efeitos se fizeram sentir também em Portugal e na organização de seu império, que, com obras suntuárias e com a falsa euforia de uma corte que nada fez de duradouro, perdeu a oportunidade de criar uma estrutura de riqueza, como perdera antes com as especiarias do Oriente.

Outras riquezas. O ferro, embora abundante, não foi objeto de atenções maiores e seu aproveitamento ficou reduzido a pequenas forjas para atendimento de necessidades locais. Não havia técnica nem disposição de explorá-lo por parte das autoridades, e o mercado consumidor era muito pequeno. O mesmo não ocorreu com o diamante, que recebeu atenções especiais e chegou a moldar a fisionomia de uma área, o Distrito Diamantino.

No entanto, as mesmas distorções observadas no sistema de exploração do ouro repetiram-se com o diamante. O policialismo tornou-se ainda mais intenso. Minas Gerais era a área mais sacrificada do Brasil, e o Distrito Diamantino a mais sacrificada de Minas Gerais. Formava quase uma unidade, ligada à coroa, sem maior dependência ao governo de Minas Gerais ou mesmo ao Estado do Brasil, o que deu origem a atritos de jurisdição. Essas disputas, as vicissitudes dos contratadores e depois a Real Extração -- monopólio metropolitano da mineração de diamantes que impôs grandes sacrifícios ao povo -- constituem a dura história da famosa área, que conservou suas peculiaridades até 1832.

A economia da mineração impôs em Minas Gerais amplo comércio, em ligações com o Norte, com o Rio de Janeiro e com São Paulo, para importação de gêneros de consumo. A pecuária do Sul, a lavoura do Rio de Janeiro e a agropecuária da Bahia se desenvolveram como projeções da economia mineira, para abastecer o centro, cuja população, por inclinação natural e determinações oficiais, dedicava-se exclusivamente à exploração de pedras e ouro.

O considerável povoamento de Minas Gerais criou um grande mercado para numerosos artigos, como tecidos, alimentos, chapéus, sapatos e outros, que passaram a ser produzidos nos núcleos urbanos que se foram formando. É o início precoce de um processo de industrialização, que se limita ao artesanato e à manufatura. Mesmo incipiente, essa atividade industrial foi proibida pelo alvará de 1785. Outra característica da sociedade mineira, peculiar na sociedade colonial, foi a existência de segmentos médios expressivos, ao contrário do que ocorria na zona canavieira, onde as relações eram marcadas pelo binômio escravo/senhor, com perspectivas mínimas para segmentos intermediários. Minas apresentava-se como uma sociedade mais aberta, onde o êxito não dependia de riqueza prévia, mas do acaso e da sorte. As sesmarias eram menores e a sociedade menos estratificada.

Politicamente, a área passou a ser o centro de atenção da coroa: foi a partir do ouro de Minas que a administração portuguesa se fortaleceu e pôde impor a presença do Estado, até então esmaecida. Estruturou-se uma ordem burocrática, que mudou os padrões do governo. Fortaleceu-se a centralização política, sobretudo na época do marquês de Pombal, entre 1750 e 1777, embora nunca se tenha chegado à centralização administrativa, de vez que o governo português sempre se ateve às peculiaridades regionais. A mudança da capital para o Rio de Janeiro, em 1763, quando se deslocou para o Centro-Sul o eixo nacional, até aí localizado no Nordeste, decorreu da importância de Minas Gerais e das lutas no Sul contra os espanhóis. A ligação com as demais capitanias inaugurou o intercâmbio, até então desconhecido.

Decadência da mineração. Durante curto mas brilhante período da história da economia mineira, a produção de diamantes e pedras preciosas -- e não mais o ouro -- tornou-se a atividade principal. Graças à exploração de jazidas diamantíferas da região, Diamantina (antigo arraial do Tijuco) se transformou na segunda cidade da capitania em importância econômica e social. Nela floresceu uma sociedade de bom nível intelectual e hábitos europeus -- fenômeno surpreendente naqueles então áridos sertões. A abundância de pedras preciosas e a facilidade de escondê-las foram motivo de muita preocupação para a corte portuguesa. A real fazenda adotava providências para evitar contrabando e ocultação da riqueza.

A economia de Minas Gerais atingira uma renda alta, criara riquezas, mas foi conduzida à estagnação e mesmo à contração. Nas últimas décadas do século XVIII os achados tornaram-se raros e a penúria geral. Com o esgotamento progressivo das jazidas, deu-se em relação ao diamante o mesmo que ocorrera ao ouro: faltaram os instrumentos necessários à exploração das camadas mais profundas do solo. A população entregou-se às atividades de subsistência ou foi fugindo aos poucos do núcleo central, para ocupar os vazios entre esse núcleo, o Rio de Janeiro e São Paulo.

Iniciou-se então a ocupação mais intensa do sul e da zona da Mata, no refluxo populacional. Muitos voltaram para o Rio de Janeiro e São Paulo. O povoamento da unidade se deu por um curioso processo de concentração, seguido de uma dispersão do centro para a periferia. A capitania decadente não tinha alternativas: a agricultura em larga escala seria contraproducente, pois não poderia concorrer com os preços mais vantajosos das capitanias litorâneas. Chegou-se a tentar a produção de gêneros exóticos, de valor mais alto e menor peso, de modo a compensar as desvantagens de transporte, mas a idéia não teve êxito. Com a atividade industrial proibida, o baixo nível tecnológico, a contração de renda e o poder aquisitivo mínimo, não era fácil desenvolver unidades produtoras. A pouca lucidez dos administradores e a falta de técnica e capital impediram uma tentativa séria de renascimento da mineração.

Recorreu-se portanto à agricultura de subsistência, para alimentar a população numerosa e pobre; outros dedicaram-se à mineração rudimentar na garimpagem dos rios. Não havia crescimento, mas sobrevivência vegetativa. Daí o acúmulo da dívida do povo, pelo não pagamento do quinto, que deu ensejo à decretação da derrama. Tudo isso num quadro de efervescência social, que dominava os ânimos de uma população sem estratificação rígida.

Apesar do policiamento dos governantes, houve não poucas manifestações de poder local, nos famosos "motins do sertão", em que potentados se insurgiram contra funcionários e não permitiram que atuassem em suas fazendas ou em áreas sob sua influência. Tornaram-se então freqüentes as lutas entre os governos de Minas e as autoridades do Distrito Diamantino, que interpretavam diferentemente as respectivas tarefas e jurisdições.

Sinais de revolta. Começaram então as conspirações contra a coroa. O espírito autonomista procurou dar expressão política ao sentimento nativista que já vinha repontando no povo. Influências geográficas e razões de sangue, fortalecidas pelo descontentamento contra a metrópole, contribuíram para a formação de um sentimento brasileiro, que a elite de intelectuais transformou em formulações políticas. Alguns jovens de família abastada que foram estudar na Europa impregnaram-se de idéias liberais e ao voltar veiculavam tais idéias na colônia. Os conspiradores de Vila Rica estavam tão bem informados sobre movimentos congêneres no continente que até já tinham em mãos uma cópia da constituição americana.

Apesar de malogrado, o movimento da inconfidência mineira (1789) valeu como fermento para futuras tentativas de rebelião política. Comprometeram-se na conjuração algumas das figuras mais importantes de Vila Rica. Juízes, padres, militares e poetas como Tomás Antônio Gonzaga, Cláudio Manuel da Costa, Alvarenga Peixoto, todos condenados. Mas a alma desses acontecimentos foi um homem de poucas letras e origem modesta -- Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, dentista e alferes da tropa. Julgado, chamou a si toda a responsabilidade pelo movimento. Condenado à forca em 21 de abril de 1792, conduziu-se com exemplar dignidade e heroísmo. Esquartejado, seus membros foram dependurados em postes no caminho das Minas e na praça principal de Vila Rica. Mas a forma espetacular e cruel desse castigo, ao invés de amedrontar, acabou por exacerbar o espírito de luta emancipacionista da colônia.

Vida agrícola. Reduzida a mineração da superfície, entregaram-se os mineiros à atividade agrícola e pecuária. A criação de gado se desenvolveu na região do São Francisco, e novos povoados se fundaram nas margens desse rio. As tribos indígenas quase não opunham resistência aos invasores e fugiam para longe. Quando se proclamou a independência, em 1822, os primitivos arraiais dos bandeirantes já haviam se transformado em dezenas de vilas e cidades. As precárias vias de comunicação eram abertas, em geral, por tropas e boiadas. Minas se povoou depressa e tornou-se uma das províncias mais importantes do império, bem diferenciada das demais pela geografia, pelas riquezas naturais, pelos costumes e forma de trabalho de seus habitantes. Passada a fase dramática da mineração, a vida civil aos poucos se estabilizou.

Alternativas econômicas. Na atividade de subsistência que dominou a economia de Minas Gerais até cerca de 1830, a pecuária se avantajou à lavoura, como trabalho mais simples. O gado era a base da alimentação e de artigos de consumo, de peles e de couros, e deu origem a uma atividade que se tornou famosa: a fabricação de queijos.

A coroa, sobretudo por inspiração do ministro conde de Linhares, quando era regente o príncipe D. João, ainda em Portugal, enviou técnicos em geologia à capitania, para que descrevessem a região e apontassem soluções. Quando o regente se transferiu para o Brasil, convocou cientistas brasileiros e estrangeiros. A siderurgia viveu nessa época seu primeiro momento, com os esforços de Wilhelm Ludwig von Eschwege em Congonhas e do intendente Câmara (Manuel Ferreira da Câmara Bittencourt e Sá) no morro do Pilar, no Distrito Diamantino, ou com a exploração do ouro de mina, como se fez em Passagem, entre Vila Rica e Mariana, a partir de 1819, em sociedade organizada também por Eschwege.

O regente enviou ainda à região técnicos em tecelagem e foi instalada uma fábrica no próprio palácio do governo, em Vila Rica. Minas Gerais passou a ser percorrida por estrangeiros, o que era antes proibido. Acorreram à capitania geólogos, botânicos, naturalistas, comerciantes e outros, muitos dos quais a descreveram em livros. A fase de transição da economia de mineração para a grande lavoura, entre 1760 e 1830, se afirmou com o café. Apesar de momentos extremos de dificuldade, foi nessa fase -- no ponto mais baixo de sua linha de desenvolvimento, quando ficou estagnada e contraída -- que a capitania atingiu sua maior vitalidade artística e teve participação marcante nos acontecimentos políticos que levaram à independência.

Panorama provincial. No início do século XIX, o território de Minas Gerais foi aumentado e o mapa da província adquiriu nova configuração, com a anexação do Triângulo, que em 1816 foi desmembrado de Goiás e passou à comarca de Paracatu. A transferência da área foi solicitada à coroa por proprietários rurais cujos interesses não eram atendidos pelo administrador goiano. Só muitos decênios depois é que a região passou a girar na órbita de Minas Gerais, uma vez que suas ligações com São Paulo eram mais fortes. As comunicações com o Espírito Santo, até então proibidas para evitar o descaminho do ouro, começaram a estabelecer-se, com a construção de uma estrada.

Em 1820, ocorreu em Portugal a revolução do Porto, para exigir a volta de D. João VI e a constitucionalização do reino. Esse evento, ao apressar a volta de D. João VI a Portugal e a nomeação de D. Pedro I como príncipe regente do Reino do Brasil, acelerou o processo de transformação política no quadro brasileiro. O rei e os governadores das províncias tiveram que jurar as bases da nova constituição portuguesa, o que impôs um clima de constrangimento em muitas unidades, entre elas Minas Gerais, cujo governador era inimigo das idéias novas e se apegava ao absolutismo e à continuidade da dependência. As províncias deveriam ser governadas por juntas provisórias e ter representantes nas cortes de Lisboa.

A eleição dessas autoridades foi perturbada por desordens provocadas menos pelo povo que pelo próprio governante, D. Manuel de Portugal e Castro, que governou a capitania de 1814 a 1822 e se manteve fiel à metrópole, sempre temeroso da evolução política que acabou por levar o Brasil à separação. O governo passou à junta, que viveu em caos permanente. Apesar de eleita a chapa da conveniência do governador da província, as contradições se impuseram: alguns membros tendiam a reforçar a causa brasileira, outros, entre eles o presidente, a restaurar os laços de dependência em relação a Portugal. No mesmo clima de insegurança criado pela autoridade, foram eleitos os deputados às cortes de Lisboa.

Ante essas dificuldades, o príncipe D. Pedro visitou a província, dirimiu as disputas e uniu as forças em choque em torno de sua pessoa. Dissolveu a primeira junta e fez eleger outra. D. Manuel, mantido na presidência da província, não teve condições de exercer a chefia e abandonou Minas definitivamente. A partir de outubro de 1823, o governo da província ficou com o presidente, nomeado pelo poder central.

Se durante a colônia a capitania mostrava certas peculiaridades, ao passar a província tornou-se semelhante às demais tanto no aspecto econômico quanto no político, uniformidade imposta pela organização do Brasil nos moldes da constituição de 1824. Mesmo assim, os mineiros continuaram a influir na marcha dos acontecimentos que abalavam a nação, entre eles o movimento pela abdicação de 1831.

Na fase da regência, a província participou ativamente do entrechoque político entre liberais e conservadores. Atuaram de modo decisivo alguns mineiros, como Bernardo Pereira de Vasconcelos e Honório Hermeto Carneiro Leão, futuro marquês de Paraná. O golpe planejado por Diogo Antônio Feijó em julho de 1832 para abater os restauradores e transformar a Câmara em Assembléia Nacional -- a chamada "revolta dos três padres" -- foi tramado no Rio de Janeiro, na chácara do padre José Custódio Dias, com a colaboração do padre José Bento Leite Ferreira de Melo, que fez imprimir em Pouso Alegre a constituição que desejava impor. Os dois padres, e também Evaristo da Veiga, outro adepto do movimento, eram representantes de Minas Gerais na Câmara. Foi também de outro mineiro, Honório Hermeto, a palavra que deteve o golpe e defendeu a ordem constitucional estabelecida.

Outro evento de importância ocorrido em Minas Gerais foi o movimento restaurador de março de 1833, em Ouro Preto, antiga Vila Rica. Os restauradores, na ausência do presidente e sob pretexto de arbítrio das autoridades -- sobretudo do vice-presidente, Bernardo Pereira de Vasconcelos -- e de outros motivos menores, como o aumento do imposto de aguardente e a proibição de enterro nas igrejas, apoderaram-se do governo em Ouro Preto. Mas Vasconcelos, aclamado ao longo das cidades em sua viagem para o Rio de Janeiro, encabeçou a deposição dos usurpadores e instalou o governo em São João del Rei.

Como as negociações não caminhassem, a luta agravou-se, até que forças consideráveis, formadas por Vasconcelos com o apoio do governo da regência, marcharam sobre Ouro Preto, que foi ocupada após dois meses de escaramuças. Iniciou-se então um processo, com perseguições e disputas pequenas: de um lado, o governo queria a anistia; de outro, a Câmara do Rio de Janeiro pedia a condenação, tendo em vista a exaltação dos ânimos. A paz só se estabeleceu com a anistia de junho de 1835, que pôs fim ao melancólico episódio, conhecido como "revolução do ano da fumaça", pela intensa neblina que anuviara a atmosfera na época e atemorizara a população.

Com o ato adicional de 1834, que substituiu a regência trina pela una, o conselho geral da província foi substituído por uma assembléia, com um legislativo mais numeroso e atuante, onde começaram a distinguir-se várias figuras de políticos que mais tarde ascenderam a altos postos. Quando da votação das leis de cunho conservador, apoiadas pelo grupo parlamentar dos chamados regressistas, que se opunham ao regente Feijó, houve participação decisiva de alguns mineiros, como Bernardo Pereira de Vasconcelos, que manipulou o processo de elaboração e tramitação das leis, e justificou com rigor a posição de passagem de liberal a regressista, em discurso famoso, peça antológica na história política do Brasil. Decretada a maioridade, em que mais uma vez se frustraram as esperanças liberais, tal como ocorrera no início da regência, houve protestos generalizados, com a pronta entrega do poder aos conservadores. Essa foi uma das causas da revolução liberal de 1842, ocorrida em São Paulo e Minas Gerais.

Revolução de 1842. Ante o temor das rebeliões populares que se verificaram do norte ao sul do país durante a regência, a consciência conservadora, que atribuía a instabilidade da situação às leis liberais -- código do processo criminal e ato adicional -- votou as "leis regressistas", que armaram o poder central. No combate a essas leis distinguiram-se os liberais, que nelas encontraram pretextos para a revolução de 1842. O fator decisivo foi a dissolução da câmara de maioria liberal, em 1º de maio daquele ano. A reação contra o estado de coisas imposto pelo governo concentrou-se em São Paulo, mas sufocada, transferiu-se para Minas. Teófilo Benedito Ottoni, com apoio de 15 municípios, dos 46 de Minas Gerais, aclamou em Barbacena um novo presidente para a província, José Feliciano Pinto Coelho da Cunha, barão de Cocais, que logo se manifestou "contra as pretensões exageradas do estrangeiro, que hoje nos dita a lei em nossa própria casa". Esse pronunciamento, que se dirigia à reivindicação inglesa da renovação dos privilégios alfandegários que estavam a findar, foi um dos primeiros protestos que assinalaram no Brasil o nacionalismo econômico.

Todavia os rebeldes perderam-se em pequenos combates sem significação. Conquistaram Queluz, mas não atacaram Ouro Preto. O governo do império nomeou o barão de Caxias para debelar o movimento, como já o fizera em São Paulo. A província do Rio de Janeiro, presidida pelo mineiro Honório Hermeto Carneiro Leão, conservador decidido, auxiliou a repressão. Em 20 de agosto, na chamada batalha de Santa Luzia -- de onde procede o nome de "luzias" dada aos liberais -- os rebeldes depuseram as armas. Havia mais de trezentos prisioneiros, quase todos absolvidos no tribunal do júri de Ouro Preto. A anistia foi afinal concedida aos liberais paulistas e mineiros.

Segundo reinado. As causas que então comoviam a nação ecoavam e provocavam movimentos em Minas Gerais, como ocorreu em relação à guerra do Paraguai, à campanha abolicionista e à republicana, com intensa participação popular. O abolicionismo encontrou resistências. Ainda em 1888, a região era a que tinha mais escravos. Contudo, a decretação da abolição não provocou maiores disputas, nem se verificaram as catástrofes previstas por seus opositores. No setor administrativo, a província foi dominada por certo marasmo. Os presidentes, nomeados, tomavam poucas iniciativas: cumpriam ordens, para garantir o sistema. O posto de presidente era eminentemente político, e seus mandatos geralmente curtos. Minas Gerais teve nessa fase 122 períodos administrativos, com a média de seis meses, o que impedia a autoridade de traçar programas de trabalho.

Ao longo de todo o período Minas Gerais teve de lutar contra a idéia de revisão e partilha de seu território. Imaginaram-se províncias a serem destacadas de suas fronteiras -- ao norte, a leste, a oeste, no Triângulo, no sul. Os projetos eram às vezes iniciativas de mineiros, mas a maior parte procedia de naturais de outras províncias. Os mais empenhados foram os paulistas, desgostosos com a criação da província do Paraná, em 1853, atribuída à iniciativa do mineiro Honório Hermeto. Planejaram como desforra fraccionar a unidade mineira por meio de sucessivos projetos, que nunca obtiveram sucesso, e assim a unidade foi mantida.

A economia imperial. A economia mineira, que inicialmente se baseara na pecuária, logo passou a ter sua base na lavoura. O café ascendeu, conquistou terras na zona da Mata e no sul, como projeção da cultura do vale do Paraíba, no território do Rio de Janeiro e de São Paulo. Cultura itinerante, podia crescer e incorporar novas áreas; o fator básico era a terra, então abundante. Mas trata-se de uma lavoura de rotina, sem qualquer abertura para as inovações tecnológicas. O que o administrador tentou fazer, ao estipular prêmios ou redução de impostos como incentivo, foi anulado pela má repartição das terras, fidelidade à rotina, falta de capitais e de crédito. Além do café, cultivou-se algodão e cana-de-açúcar, ou culturas menores.

A pecuária mereceu atenções, com a utilização de técnicas, distribuição de revistas e livros especializados, introdução de reprodutores de raça. A indústria limitava-se a simples artesanatos ou manufaturas de tecidos, chapéus, alimentos, calçados e cerâmica: multiplicavam-se as unidades, destinadas à produção em escala reduzida, para consumo próximo. Raros eram os artigos que se dirigiam ao mercado distante, para exportação às terras vizinhas. Apenas Juiz de Fora adquiriu relevo, a partir de 1860, graças ao esforço da iniciativa privada, na pessoa de empresários como Henrique Halfeld ou Mariano Procópio.

Minas Gerais possuía milhares de pequenos engenhos de açúcar, com produção inferior à de outras áreas. A tentativa do poder imperial de salvar a indústria açucareira com os engenhos centrais, deu resultados insignificantes ou nulos. No tocante à mineração, o que se fez foi pouco: continuou a garimpagem, a atividade aleatória em busca de ouro e diamantes, e a obtenção de ferro. Tentou-se reanimar o garimpo do ouro, para o que contribuiu decisivamente a lei de 1824, que permitia ao estrangeiro a exploração das minas através de companhias. Tais companhias, em geral inglesas, se multiplicaram e supriram a falta de iniciativa local, fruto da pobreza comum ou da inexistência de espírito associativo de empresa. O Reino Unido, em fase expansionista, aproveitou o ensejo a partir daquele mesmo ano de 1824.

O presidente Francisco José de Sousa Soares de Andréia denunciou em 1843 as teorias que "fizeram cair as nossas melhores minas de ouro em mãos estrangeiras", e preconizou a criação de companhias nacionais. O êxito dessas companhias foi pequeno. "Mesmo as poderosas libras esterlinas das companhias inglesas" -- observava em 1873 o presidente Venâncio José de Oliveira Lisboa -- "não têm podido obter resultados correspondentes e acham-se algumas em liquidação". A mais importante iniciativa foi a St. John D'El Rey Mining Limited, de 1830: constituída para explorar a área de São João del Rei, consolidou-se em Morro Velho -- o maior esforço do gênero já feito no país. Em 1832 foi extinta a Real Extração, e o Distrito Diamantino se incorporou normalmente à província de Minas Gerais. Em 1873 instalaram-se as primeiras casas de lapidação, serviço a princípio realizado nos Países Baixos, depois parcialmente em Portugal, e a partir de 1812 no Rio de Janeiro.

Quanto ao ferro, multiplicavam-se as pequenas unidades, forjas com tecnologia primitiva e para atender às necessidades próximas e imediatas. Não teve maior repercussão um esforço lúcido e continuado, como o de João de Monlevade, a quem se deve, entre outras iniciativas, a Usina de São Miguel, às margens do rio Piracicaba. Só no penúltimo ano da monarquia, em 1888, é que se cogitou de exploração mais racional, com a criação da Usina Esperança. Mas mesmo esta destinava-se a operar em pequena escala.

Mão-de-obra. No que tange à política de aprimoramento dos recursos humanos, tentou-se o ensino técnico e cogitou-se da criação de escolas de agricultura e liceus de artes e ofícios. No entanto, as leis reguladoras da matéria não eram executadas, ou as escolas, quando abertas, não dispunham de alunos. O único passo importante nessa área foi a criação da Escola de Minas, instalada em 1876 e responsável pela formação de gerações de geólogos e engenheiros que atuaram na monarquia e na república.

Ainda quanto à mão-de-obra, tentou-se a criação de colônias, para atrair imigrantes. Algumas experiências foram feitas. O primeiro movimento expressivo foi a empresa do Mucuri, idealizada pelo político Teófilo Ottoni. Da idéia de colocar famílias da ilha da Madeira em colônia agrícola em Santa Clara, passou Ottoni a cogitar da utilização de colonos alemães, e para isso contratou com uma empresa a vinda de dois mil agricultores. Esses imigrantes, chegados em 1856, traziam alguns elementos úteis, mas a maior parte era de marginais, que a polícia de Potsdam se interessava em expatriar. Outras levas de imigrantes, de diversas procedências, chegaram em seguida.

Muitos desses estrangeiros, quando não vitimados pelo clima, por doenças ou pela falta de assistência, fixaram-se na terra, produziram e lançaram as bases de futuros núcleos. Mas a experiência do recurso à imigração não conseguiu ser popular em Minas Gerais. Um dos poucos projetos a obter algum êxito foi a colônia Pedro II, perto de Juiz de Fora, quase só de alemães. Outra colônia trouxe pouco mais de uma centena de americanos fugidos à guerra de secessão, que se localizaram às margens do rio das Velhas, mas logo se dispersaram e transferiram-se para Sabará e depois para outros pontos. No fim do período, houve também uma experiência digna de registro, a colonização feita pelos italianos, em São João del Rei.

Se não foi marcante a presença do estrangeiro, de modo a configurar a sociedade, a economia e a etnia locais, como se deu em São Paulo ou no sul do país, mesmo assim a ação de alguns europeus que estiveram em Minas como visitantes ou que aí se estabeleceram de vez é digna de registro. Entre os visitantes, destacam-se naturalistas de renome, como o inglês John Mawe, o francês Auguste de Saint-Hilaire e o alemão Wilhelm Ludwig von Eschwege, autores de estudos científicos fundamentais para determinadas regiões de Minas Gerais.

Entre os que permaneceram mais tempo, salientam-se Guido Tomás de Marlière, que se embrenhou pelos sertões e teve contato com tribos; o sábio naturalista dinamarquês Peter Wilhelm Lund, considerado o pai da paleontologia brasileira.

A Escola de Minas de Ouro Preto foi dirigida inicialmente por franceses, alguns dos quais executaram importantes trabalhos, não só como professores, que formaram diversas gerações de geólogos e engenheiros, mas como técnicos que contribuíram para elevar o nível científico e tecnológico da atividade siderúrgica.

No que se refere ao crédito, embora funcionassem em Minas Gerais agências do Banco do Brasil, o comum era a usura. Os primeiros bancos mineiros só apareceram nos dois últimos anos da monarquia, com pequenas exceções de cunho local. Rareavam as empresas de transporte, apesar da garantia de juros e outras vantagens, como decorrência natural das dificuldades topográficas a vencer, das longas distâncias e da falta de colaboração associativa. Mesmo assim, diversas estradas de ferro foram construídas no sul e na zona da Mata, principalmente para transporte de café.

A Estrada D. Pedro II alcançou Minas Gerais já em 1869, e Ouro Preto em 1889. O sistema ferroviário anteriormente existente fora criado sem programa e com favores especiais. Também as rodovias ocuparam atenções: o governo traçou diversos planos, mas o que foi executado tinha em vista atender a emergências, com simples ligações vicinais. Os rios não se prestavam à navegação regular. De parte do administrador, a ideologia oitocentista era teoricamente liberal e não considerava dever do estado atuar na esfera econômica, a não ser através da propaganda de produtos, divulgação de jornais, revistas e livros especializados, prêmios a inventores ou produtores, isenção de tributos e garantia de juros. Mas faltava o agente empresarial, que caracteriza o investidor do sistema capitalista.

República Velha. Por ocasião da proclamação da república, Minas Gerais era a mais populosa unidade da federação. Não foi fácil, nos primeiros anos, a adaptação ao novo sistema político: de 15 de novembro de 1889 a 15 de junho de 1891, registram-se em Minas Gerais 14 períodos administrativos, e passaram pelo governo sete autoridades. A idéia de fragmentação voltou à baila. O movimento tendente à criação do estado de Minas do Sul não teve êxito: representava apenas a revolta de políticos sulinos contra os do centro ou do norte. Além do mais, pouco depois os senhores do sul, mais ligados à agricultura, passaram a dominar o quadro estadual.

Dos dois grandes problemas da república -- lutas militares na capital e no Sul e crise financeira -- só o segundo atingiu o estado, e em escala pequena. A crise, que abalou o Rio de Janeiro, teve apenas reflexos indiretos na maioria das unidades da federação, uma vez que os estados, como no caso mineiro, não se arriscaram na aventura do jogo da bolsa. As lutas militares, que influíram sobre os políticos como força de divisão, fizeram mesmo com que Minas viesse a ser procurada pelos que fugiam às incompatibilidades no Rio de Janeiro, muitos deles em exílio forçado ou voluntário, em busca de segurança.

O problema que dominou a cena e centralizou as atenções foi o da mudança da capital do estado. A necessidade já vinha sendo sentida há muito tempo, pois no regime federativo as sedes administrativas adquirem relevo maior, e a velha cidade de Ouro Preto não tinha condições de se expandir. Mas a população de Ouro Preto opunha-se à idéia, ao mesmo tempo que se apresentavam vários pontos como possíveis para escolha: Barbacena, Várzea do Marçal, Juiz de Fora, Paraúna e Belo Horizonte. Chegou-se à luta, com a transferência do legislativo para Barbacena, até que se optou pelo velho Curral del Rei. A nova cidade, planejada por grupo de técnicos, após quatro anos de trabalho, foi inaugurada em 1897, com o nome de Cidade de Minas, logo mudado, em 1901, para Belo Horizonte, que era o nome da comarca.

O federalismo inscrito no texto constitucional teve exercício discutível em Minas Gerais, como no resto do Brasil. As distorções que lhe foram impostas tornaram-no praticamente nulo, como se observa sobretudo a partir de 1898, com a "política dos estados" ou "dos governadores", de Campos Sales. Nela se armou todo um esquema de transações entre as partes e o governo central em benefício do eventual presidente da república e de oligarquias locais, que se vêem fortalecidas. O coronelismo atingiu uma plenitude antes desconhecida.

Só dois estados tiveram relevo na ordem que se institucionalizara e marcaram a denominada República Velha, em período que se estende até 1930: São Paulo e Minas Gerais. O jogo político que se verificou no estado foi o convencional, sem qualquer nota de surpresa e sem qualquer contestação possível aos candidatos oficiais. O Partido Republicano Mineiro (PRM) era o senhor da situação: a política não ultrapassava o nível comum das pequenas disputas, sem maior repercussão, embora por vezes tenham acabado em conflitos sangrentos. O PRM dispunha de tudo, das chapas de candidatos até à realização das eleições. Seus chefes, dominadores, impuseram-se no estado e influíram na república.

Na primeira década do século XX, a administração estadual mostrou interesse pela vida econômica. Em 1903 realizou-se em Belo Horizonte um Congresso Agrícola, Industrial e Comercial, com programa de desenvolvimento econômico e protecionismo, promovido por Francisco Antônio Sales, que convocou para dirigi-lo João Pinheiro da Silva. Embora o programa não apresentasse novidades, pois as medidas que pregava já eram conhecidas e até objeto de leis, representou uma tomada de posição mais orgânica e coerente no estímulo às atividades agrícolas e industriais, com ajudas de vários tipos e entusiasmo pelo ensino técnico -- prenúncio da política que só veio a ser praticada com decisão e êxito muitas décadas depois.

Minas Gerais foi um dos signatários, juntamente com os estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, do convênio de Taubaté, em 1906, para regular a produção de café, base da economia da área e do país, que se encontrava em crise com a superprodução. O governo federal depois encampou o convênio, já que o vulto das operações punha em jogo o sistema econômico e financeiro do Brasil.

Com João Pinheiro na presidência do estado e Afonso Pena como presidente da república, o estado teve o seu primeiro momento de projeção nacional, após a implantação do novo regime. Esboçou-se tímido movimento de renovação nas práticas políticas -- o chamado "jardim de infância" -- com base sobretudo em parlamentares mineiros e nos chefes do estado e da nação. Tudo isso se perdeu com a morte de Afonso Pena e de João Pinheiro, seu sucessor natural na presidência da república.

A campanha civilista, movimento que no plano federal marcou o rompimento de Rui Barbosa com a candidatura do marechal Hermes da Fonseca à presidência da república, teve em Minas adeptos fervorosos. Pela primeira vez a luta pela sucessão presidencial constituiu uma campanha política. Não teve o apoio do governo, que se manteve fiel à presidência da república, na prática antiga, mas o de políticos jovens e das concentrações urbanas. Mesmo assim, Rui Barbosa foi derrotado por uma frente na qual se alinhavam os mais poderosos coronéis, que usaram os conhecidos recursos de vencer eleições. A convencional alternância de paulistas e mineiros na chefia do país teve prosseguimento em futuros governos: passaram ainda pela presidência os mineiros Venceslau Brás, Delfim Moreira e Artur Bernardes.

A economia continuou a ser comandada pelo café, mas, ante o predomínio paulista, desenvolveram-se outros cultivos. Na pecuária, tradição regional, recorreu-se a várias experiências importantes, a principal das quais com o gado da Índia, no Triângulo, do qual se originou um tipo especial de gado, ajustado à região: o induberaba ou indubrasil. Foi uma experiência difícil, mas que terminou com êxito, e o zebu passou a constituir uma etapa importante da história econômica de Minas.

A revelação dos grandes depósitos de minério de ferro existentes no estado, feita no Congresso de Estocolmo, em 1908, atraiu novamente o interesse pela riqueza mineral de Minas. O capitalismo estrangeiro mostrou-se interessado em sua exploração. A Itabira Iron Ore Co., primeiro grupo eminentemente inglês, estabeleceu-se em 1910, e em 1918 passou o negócio a outro grupo, à frente do qual estava o empresário americano Percival Farquhar.

Em 1919, como representante da Itabira, Farquhar assinou o projeto para explorar o manganês de ferro naquela cidade mineira. Prestigiada pelo presidente Epitácio Pessoa, mesmo assim a iniciativa teve de lutar muitos anos pela conquista do direito de exportar, em batalha que se prolongou até à primeira guerra mundial, sem êxito. O óbice principal foi a defesa intransigente da política nacionalista por parte do presidente do estado, Artur Bernardes, que recrudesceu quando este assumiu a presidência da república, em 1922, e foi secundado, no plano estadual, por seu sucessor, Raul Soares.

Embora nem um nem outro fossem contrários à exportação de minérios, só a desejavam com a contrapartida da construção de uma usina siderúrgica em Minas Gerais e sem os monopólios pretendidos, seja de exportação, seja de uso da estrada de ferro que ligava os depósitos a Vitória ES. O contrato foi sendo protelado, até que dificuldades financeiras nos Estados Unidos e na Europa, a crise de 1929 e o nacionalismo, encampado como bandeira por Getúlio Vargas, levaram o empresário a abandonar seus planos. Embora o governo seguinte, de Antônio Carlos, fosse mais receptivo, nova barreira surgiu com o primeiro período presidencial de Getúlio Vargas.

Em 1939, a Companhia Brasileira de Mineração e Siderurgia incorporou a Itabira Iron, ficando Farquhar com 48% das ações; em 1942, a Companhia Vale do Rio Doce comprou todos os direitos e propriedades da empresa. A derradeira iniciativa de Farquhar no Brasil foi a criação, no fim da década de 1940, da empresa siderúrgica Acesita, em Minas Gerais.

O movimento de exploração de minério no próprio estado cresceu aos poucos. As forjas antigas sobreviveram e, ainda no final do século XIX, inauguraram-se usinas, como a Esperança e outras unidades pequenas. Em 1919 entrou em operação em Sabará a Companhia Siderúrgica Mineira. A participação em alta escala de capitais franceses, belgas e luxemburgueses deu-lhe impulso: a Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira, fundada em 1921, tornou-se o primeiro grande centro de indústria pesada no Brasil, e foi um dos passos mais importantes na formação de uma infra-estrutura industrial que teve depois desdobramentos.

O último governo estadual na República Velha foi o de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, a cuja atuação se deve a realização de relevantes obras públicas, além de outras iniciativas, quer de natureza política, como a que redundou na instituição do voto secreto, medida democrática que o Brasil não conhecia, quer de caráter educacional, como a criação, em Belo Horizonte, de uma universidade (1927) e a renovação de todo o ensino primário, em experiência pioneira no país. Foi seu agente o secretário Francisco Campos, que conseguiu a cooperação de um grupo de técnicos estrangeiros -- psicólogos e professores, dentre os quais se destacou a educadora Helena Antipoff -- que traçaram o plano de uma reforma de ensino primário e médio, com a criação da Escola de Aperfeiçoamento, que formou educadores na linha mais avançada de então, a da "escola nova". Alguns desses especialistas estrangeiros permaneceram em Minas, como a professora Helena Antipoff, que continuou seu trabalho em outras experiências educacionais importantes.

Revolução de 1930. Vitoriosa a revolução de 1930, colocou-se o problema da chefia do estado. Em agosto de 1931, houve um esboço de golpe para afastar do poder o presidente eleito, Olegário Maciel, mas a tentativa falhou ante a energia revelada pelo velho chefe. Em outubro do mesmo ano, organizado por Francisco Campos, formou-se um movimento de tipo direitista, com uniformes e símbolos, que não teve ressonância. Mas a atuação de Minas Gerais no processo revolucionário que se instalou no país continuou decisiva. Graças ao vigor de seu presidente, o estado foi fator imprescindível junto às forças federais para abater a revolução constitucionalista de São Paulo em 1932.

Em setembro de 1933, com a morte de Olegário Maciel, teve início a disputa em torno da nomeação do interventor do estado, episódio em que se distinguiram Gustavo Capanema e Virgílio de Melo Franco. O escolhido por Getúlio Vargas foi um político menos atuante, Benedito Valadares, que se manteve na chefia do estado, como interventor, até 1935. A partir daí, passou a governar como presidente eleito indiretamente pela assembléia, no exercício de um mandato que se prolongou até o fim do Estado Novo, em 29 de outubro de 1945.

Minas Gerais foi o agente garantidor da ordem, a base do presidente Getúlio Vargas, principalmente durante o Estado Novo. Como os outros estados, seguiu o compasso imposto por uma administração centralizada. Apesar das dificuldades do momento e da contenção de gastos, as iniciativas do governo não foram interrompidas, sobretudo no campo de ação da Secretaria de Agricultura, tanto sob a gestão de Israel Pinheiro da Silva, como depois, com Lucas Lopes. Foi então elaborado um plano de industrialização do estado e fundou-se o Instituto de Tecnologia Industrial.

Por essa época ocorreu o debate em torno da instalação de uma grande usina, pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), criada pelo governo da república com capitais americanos e britânicos, decorrência de acordos ensejados pela segunda guerra mundial. Minas Gerais pleiteou que a empresa se localizasse em seu território, mas o escolhido foi o estado do Rio de Janeiro, com a construção de Volta Redonda. Na mesma ocasião, foi criada a Companhia Vale do Rio Doce, instalaram-se novas siderúrgicas e a Belgo-Mineira teve seu parque ampliado.

Importante como iniciativa governamental foi a construção da cidade industrial, ao lado de Belo Horizonte, a partir de 1938, no município de Contagem. Verdadeiro pólo de desenvolvimento, a cidade tornou-se um núcleo de estabelecimentos básicos, que irradiam influência. Outros empreendimentos relevantes, no setor industrial, foram instalados em cidades vizinhas da capital. Belo Horizonte passou então a eixo da vida econômica do estado, e não apenas seu centro político.

Uma das primeiras manifestações na luta contra o Estado Novo, embora o governo local o apoiasse, foi o Manifesto dos Mineiros, de 24 de outubro de 1943, tímido documento que pedia a democratização do país, mas que tanto preocupou o poder central. Com a queda de Vargas, em 1945, vários interventores se sucederam, até a normalização democrática. Um plano de recuperação econômica e de eletrificação abriram para Minas uma nova fase, que se acelerou no governo de Juscelino Kubitschek. A infra-estrutura então criada permitiu o crescimento econômico.

Unidades militares de Minas Gerais lideraram em 1964 o movimento que derrubou o presidente João Goulart. Na década de 1970, o setor primário da economia, até então dominante, cedeu lugar à indústria de transformação, sobretudo depois da instalação de fábricas de automóveis na área metropolitana de Belo Horizonte. Na última década do século xx, o Programa de Indução à Modernidade Industrial (Proim) levou o estado passou a rivalizar com o Rio de Janeiro pelo segundo lugar na economia nacional.