sábado, 8 de maio de 2010

Pernambuco: História

A história de Pernambuco teve início em 1534, com a carta de doação de D. João III, a Duarte Coelho, de sessenta léguas de terra, que se estendiam do rio São Francisco "ao rio que cerca em redondo toda a ilha de Itamaracá (...) e abrangendo a terra da banda sul do mesmo rio", o Santa Cruz, onde Cristóvão Jacques instalara a primeira feitoria. Depois da fundação de Igaraçu, entregue a Afonso Gonçalves, Duarte Coelho construiu Olinda, onde, a partir de 1536, desenvolveu o programa colonizador, que resultaria no melhor rendimento do governo donatarial do Brasil. Foi o único, entre os donatários, que conseguiu implantar-se firmemente em seus domínios e legá-los a seus descendentes.

Fundador de uma dinastia, Duarte Coelho venceu obstáculos diversos, como a resistência dos índios tabajaras e caetés ou as perturbações causadas por degredados e salteadores de terra e mar, além da precária assistência do reino, assuntos sempre mencionados nas cinco cartas restantes das que dirigiu ao rei e que constituem a documentação histórica mais válida sobre os seus quase vinte anos de governo na capitania.

Duarte Coelho foi o verdadeiro artífice da civilização açucareira em Pernambuco. Contrário à economia simplesmente extrativa, a do pau-brasil, e à da busca sistemática do ouro, voltou-se para o plantio e a manutenção dos canaviais com o braço indígena e dos negros, que, do século XVII em diante, com o aumento do tráfico africano, dominaram os trabalhos de campo. Em 1537 distribuía terras aos colonos, inclusive o cunhado Jerônimo de Albuquerque e a irmã, dona Brites, terras também ocupadas pelas lavouras de subsistência. Em 1541, voltou de sua primeira viagem a Portugal, com "engenhos de açúcares que de lá trouxe contratados". No ano seguinte, comunicou a el-rei a existência de "grande soma de canas plantadas" e o próximo término de "um engenho mui grande e perfeito", que seria o Salvador, à margem direita do Beberibe, como o N. S. da Ajuda seria o de Jerônimo de Albuquerque.

Daí em diante, os engenhos povoaram a várzea do Capibaribe -- vários, transformados em bairros e subúrbios de Recife, mantiveram as denominações primitivas --, dos rios Jaboatão e Pirapama, como, em seguida, a área situada entre o cabo de Santo Agostinho e a foz do São Francisco. Em 1584, eram 66 e, no início do século XVII, 121, que alimentavam o luxo de Olinda, onde frei Vicente do Salvador compôs capítulos de sua História do Brasil e onde o padre Fernão Cardim viu "mais vaidade que em Lisboa".

Duarte Coelho cuidou da imigração de gente "nobre e limpa", famílias e padres, que influíram na formação de uma sociedade também intelectual. A literatura brasileira começou nessa época, com a Prosopopéia, de Bento Teixeira, e as sessões do Colégio dos Jesuítas, onde se assinalou o ciclo literário colonial do século XVI, inclusive nos cursos dos conventos. O Seminário de Olinda seria o "núcleo de preparação da independência do Brasil".

Invasão holandesa. Atraídos pela riqueza principal da capitania, o açúcar, os holandeses desembarcaram na praia de Pau Amarelo. De 1630 à chegada de Maurício de Nassau em 1637 -- fase assinalada pela ação violenta do Supremo Conselho Holandês, inclusive para impor o calvinismo --, conquistaram Olinda e Recife. No período seguinte, o de Maurício de Nassau e seu grupo de cientistas e artistas, sobressaiu a repressão às injustiças do Supremo Conselho, o respeito às crenças religiosas, a reconstrução de Olinda depois do incêndio de 1631 e a reconstrução da Cidade Maurícia, na ilha de Antônio Vaz, atual bairro de Santo Antônio.

Aí se desenvolveu a notável obra urbanística nassoviana, representada pelos palácios de Friburgo e da Boa Vista, pela abertura de ruas, inauguração de canais, pontes e diques, construção de residências e de uma arquitetura flamenga cujos remanescentes permaneceram até a segunda metade do século XIX.

A luta contra os holandeses chegou à sua culminância nas batalhas dos Guararapes, que Oliveira Lima considerou "o mais belo feito dos nossos fastos coloniais". A capitulação dos invasores foi assinada a 26 de janeiro de 1654, na Campina do Taborda.

Conquista do sertão. De Olinda saíram os pioneiros da agroindústria do açúcar, que ocupou a planície costeira da capitania, e os sertanistas, que foram estabelecer os "currais de fora" na margem esquerda do São Francisco, no planalto da Borborema e no sertão mais oriental da cunha nordestina. Também dali partiram os guerreiros para a conquista do "litoral leste-oeste", onde Olinda gerou João Pessoa, Natal e Fortaleza, adotou São Luís do Maranhão e pôs uma sentinela na boca da Amazônia: Belém do Pará.

Ocupada a planície costeira (zona da mata) com numerosos engenhos de açúcar, os pernambucanos firmaram o caminho continental do sul, ao passar pelas povoações de Porto Calvo, Camarajibe, Santa Luzia do Norte e Alagoas, e ao atingir o rio São Francisco, na povoação de Penedo. Foi-lhes fácil, então, penetrar para oeste, ao subir o vale do curso inferior do grande rio, até perto da cachoeira que veio a pertencer a Paulo de Viveiros Afonso.

Em 1611, os sertanistas pernambucanos já ocupavam as abas da região semi-árida do atual estado de Alagoas, e fixaram-se em Jaciobá, hoje Pão de Açúcar. A invasão holandesa sustou a expansão sertaneja de Pernambuco, somente reiniciada após a expulsão dos flamengos, em 1654. Quanto aos holandeses, com suas tropas mercenárias (inclusive de ingleses e franceses), mal dominaram a zona da mata, onde foram emboscados por brancos, índios, negros, caboclos, mulatos, cabras e cafuzos, durante 24 anos.

Terminada a "guerra do açúcar", os pernambucanos retomaram a expansão pelo sertão do baixo São Francisco e começaram a percorrer a Borborema, através dos vales do Capibaribe e do Ipojuca, para, de suas cabeceiras, atingirem os vales secos do Moxotó e do alto Pajeú. Ainda no fim do século XVII, os vales do Capibaribe e Ipojuca foram explorados e povoados, de modo a permitir, logo depois, viajassem por eles os "correios" caminheiros de Olinda. O "caminho do Capibaribe" e o "caminho do Ipojuca" convergiam para a vila de Cabrobó. O desconhecimento desses roteiros levou Capistrano de Abreu a afirmar: "na segunda metade do século XVIII, não se penetrava no Recife além de Bezerros, a 15 léguas para o interior: o que ficava além entendia-se com a Bahia".

Ao contrário, ainda na segunda metade do século XVIII antigas famílias pernambucanas de criadores de gado já povoavam a região do agreste e várias partes da zona sertaneja mais próxima, onde começaram a surgir as primeiras freguesias. Se a zona centro-ocidental do sertão de Pernambuco pertenceu à gente baiana da Casa da Torre, com os extensos territórios que lhe foram dados em generosas sesmarias, na realidade não foi o grande sesmeiro o seu povoador.

No agreste e no sertão pernambucanos, como em outras partes da região semi-árida do Brasil, a criação extensiva de gado determinou a chamada "época do couro", historicamente identificada por Capistrano de Abreu. Lembre-se que o boi, o cavalo e o jumento foram utilizados como forma de transporte até o aparecimento do caminhão. Antes, o carro de boi era o único veículo destinado aos grandes carretos.

Guerra dos Mascates. Já em 1709, Recife, com a transição regular de povoação a vila (Portugal não lhe confirmou os foros de cidade conferidos por Maurício de Nassau), queria libertar-se da jurisdição de Olinda. A revolução de 1710 foi uma luta de classes: de um lado, a nobreza açucareira e demais produtores olindenses ligados à agroindústria canavieira; do outro, os comerciantes portugueses de Recife (mascates), que os exploravam e contavam com a proteção do governador Sebastião de Castro e Caldas.

Embora lusos e nativos se tivessem unido na luta contra os holandeses, as rivalidades recomeçaram depois da vitória sobre o invasor. Recife destacara-se como porto e cabeça comercial da região. Sua primazia em relação a Olinda, quanto às trocas comerciais e às comunicações, gerou o antagonismo econômico e social entre a precária aristocracia agrária e o grupo mercantil em ascensão. Esse antagonismo chegou à luta ostensiva, assim desenvolvida: atentado ao governador Sebastião de Castro e Caldas; levante dos mascates em 18 de junho de 1711; e posse do governador Félix Machado Mendonça, em outubro do mesmo ano.

Revoluções libertárias. A expansão das idéias liberais, geradas pela revolução francesa, alcançaram Pernambuco ainda nos fins do século XVIII. Foi seu arauto o naturalista Manuel de Arruda Câmara, que se formara em medicina em Montpellier, depois de ter freqüentado a Universidade de Coimbra. Professou aos 31 anos de idade na Ordem dos Carmelitas, em seu convento em Goiana, e recebeu o nome de frei Manuel do Coração de Jesus. Durante seus estudos na Europa, obteve de Roma a secularização. Em 1796 já estava em Pernambuco, no exercício da medicina. A partir de então, no início de seu apostolado político, apenas interrompido por viagens de estudo e pesquisa, Arruda Câmara fundou o Areópago de Itambé e ali doutrinou, secretamente, muitos pernambucanos e paraibanos que mais tarde seriam figuras de prol nas revoluções libertárias do Nordeste.

As novas idéias político-sociais encontraram repercussão no seminário de Olinda, fundado em 1800 pelo bispo José Joaquim da Cunha de Azeredo Coutinho, no conjunto arquitetônico constituído pela igreja de Nossa Senhora da Graça e pelo antigo Colégio dos Jesuítas. Enquanto seminaristas e jovens sacerdotes aderiam às idéias liberais, as lojas maçônicas doutrinavam seus membros e inculcavam-lhes os princípios de "liberdade, igualdade e fraternidade". A ação das academias secretas prolongou-se do fim do século XVIII à própria deflagração do movimento republicano de 1817. Do Areópago de Itambé, que se dissolveu em 1801, procedeu a Academia de Suassuna, fundada no Cabo, em 1802, por Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque. Por sua vez, a Academia de Suassuna deu origem a várias outras sociedades secretas, como a Academia do Paraíso, fundada em Recife pelo padre João Ribeiro.

Por decreto de 24 de fevereiro de 1821, D. João VI, ainda no Brasil, aprovou as bases da constituição a ser elaborada pelas cortes constituintes reunidas em Lisboa e prometeu adotá-la em todo o território do reino. A notícia do ato real chegou a Recife nos começos de março, quando provocou manifestações de regozijo. O próprio general Luís do Rego Barreto, governador militar de Pernambuco, associou-se a essas manifestações e fez a leitura pública do decreto real, assistiu a um solene Te Deum de ação de graças e lançou uma proclamação em que dizia: "A opinião e as luzes do século demandam novas instituições, fundadas sobre os princípios liberais, que igualmente concorrerão para a grandeza, prosperidade e ventura dos povos".

A resolução de 24 de abril das Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, ao considerar legítimos os governos já estabelecidos ou que viessem a estabelecer-se em apoio ao movimento liberal de todo o reino, provocou a ira de Luís do Rego, o que o levou a redobrar suas violências. Depois de um atentado malogrado contra sua vida, a perseguição aos patriotas recrudesceu, com numerosas prisões e deportações.

Ao se tornar insuportável a vida em Pernambuco, passou-se a conspirar em todo o território da capitania, para a derrubada do governador. Reunidos em Goiana, em 29 de agosto os patriotas elegeram a junta do governo da província, diretamente subordinada ao rei e às cortes, para o cumprimento das resoluções destas e das ordens reais no território pernambucano. Composta de elementos de prestígio e tendo como presidente o doutor Francisco de Paula Gomes dos Santos, a junta de Goiana oficiou a Luís do Rego e convidou-o a formar o governo constitucional em Pernambuco, segundo as normas baixadas pelas cortes. O governador tergiversou. Organizadas as tropas, a junta marchou sobre Recife, travou batalha em Olinda, em 21 de setembro, e aquartelou-se na povoação de Beberibe, de onde dirigia o cerco da capital.

Mesmo sitiado, Luís do Rego teimava em continuar como dirigente legal de Pernambuco, por meio da presidência da junta de 31 de agosto, que então formara. Não podendo romper o cerco, todavia, resolveu, em 5 de outubro, aceitar um acordo com a junta de Goiana, conhecida na história como convenção de Beberibe, pela qual passaria a governar, apenas, Recife e Olinda; a junta de Goiana governaria o resto do território pernambucano, até as cortes de Lisboa decidirem sobre a eleição de uma junta que administrasse toda a província.

Na forma do estabelecido pelo decreto de 1º de setembro, baixado pelas cortes de Lisboa, procedeu-se à eleição da junta provisória do governo da província, em 26 de outubro. Dois dias depois, essa junta foi empossada, sob a presidência de Gervásio Pires Ferreira, e começou a praticar verdadeiros atos de soberania brasileira: o Brasil independente a encontraria no poder, sem mais a presença das tropas portuguesas em território pernambucano.

Muitos liberais pernambucanos sempre haviam sonhado a independência com a república. A integração da província de Pernambuco no império nascente não impediu, assim, que antigos patriotas desejassem a forma republicana de governo. Para estimulá-los nesse intento, ocorreram a dissolução da Assembléia Constituinte por D. Pedro I e a outorga da Carta Constitucional de 25 de março de 1824.

A efervescência política em Pernambuco, nos primeiros tempos do império, pode ser medida pela sucessão de juntas governativas, após o afastamento da presidida por Gervásio Pires: a 18 de setembro de 1822 a junta temporária presidida por Francisco de Paula Gomes dos Santos e secretariada por José Mariano de Albuquerque Cavalcanti; a 2 do mesmo mês, Afonso de Albuquerque Maranhão (presidente) e José Mariano de Albuquerque Cavalcanti (secretário); a 15 de dezembro de 1823 de Manuel de Carvalho Pais de Andrade (presidente) e José da Natividade Saldanha (secretário). Também nessa data foi empossado como governador das armas o coronel José de Barros Falcão de Lacerda. Nova junta, ainda presidida por Pais de Andrade e secretariada por Natividade Saldanha, foi escolhida por colégio eleitoral em janeiro de 1824.

O descontentamento dos pernambucanos só precisava de um motivo para explodir em revolta contra o império. Esse motivo foi a retirada da força naval que guarnecia o porto de Recife, quando corriam rumores de que Portugal preparava uma expedição para atacar Pernambuco. O presidente da província, Manuel de Carvalho Pais de Andrade, lançou um manifesto contra o governo do império, em 2 de julho de 1824, em que proclamava a Confederação do Equador, constituída pelas províncias de Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí. Pais de Andrade instituiu a bandeira da confederação e convocou uma assembléia constituinte, enquanto frei Joaquim do Amor Divino Caneca elaborava um projeto de constituição para a nova república confederada.

A reação do governo do império contra a Confederação do Equador foi pronta e enérgica. Vencida a resistência de José de Barros Falcão de Lacerda, em Ponte dos Carvalhos, as forças do império conquistaram Recife e Olinda, e encerraram assim o episódio libertário da Confederação do Equador. Pais de Andrade, Natividade Saldanha e Falcão de Lacerda, entre outros chefes revolucionários, conseguiram fugir, escapando à pena de morte, que vitimou 16 patriotas: oito em Pernambuco, cinco no Ceará e três no Rio de Janeiro. Na execução dessas condenações, sobressaiu a morte violenta de frei Caneca.

Império. Nove dias depois de proclamada a independência, as juntas eleitorais de Olinda e de Recife dirigiram-se ao colégio eleitoral da antiga capital e pediram condescendência em tudo quanto fosse relativo à mudança do governo. A resposta do colégio eleitoral fez-se imediata, solidária com a formação de quatro corpos de primeira linha, "a fim de proteger as deliberações" e "conseguir a paz e tranqüilidade da província, negócios de primeira importância, uma vez que a tropa se achava em armas, a pretexto de coadjuvar o projeto".

A 18 de outubro, assinaram-se os termos de posse e juramento do novo governo temporário, no Senado e na Câmara de Olinda, onde, na presença do juiz-presidente, vereadores e cidadãos de todas as classes "convocados no mesmo dia e por bando", os comandantes da força armada, tropa e povo expuseram que vinham depor a junta provisória do governo da província para elegerem um novo governo, até que os eleitores de cada província elegessem um que ficasse permanente, a fim de evitar a guerra civil e a anarquia. Esse governo temporário não iria prevalecer: só o governo provisório formado em 27 de outubro de 1821, resultante da convenção de Beberibe e sob a chefia de Gervásio Pires Ferreira, seria considerado legítimo.

A esses atos ocorridos em Pernambuco nas duas primeiras semanas do Brasil independente seguiram-se a eleição da junta provisória da província, presidida por Afonso de Albuquerque Maranhão e, em 14 de outubro de 1822, a apuração das eleições de deputados à Assembléia Legislativa (constituinte) do Brasil.

Fundado em Recife em 7 de novembro de 1825, por Antonino José de Miranda Falcão, o Diário de Pernambuco é o mais antigo órgão de imprensa em circulação contínua na América Latina, partícipe, desde seu começo, de todos os movimentos político-culturais de interesse pernambucano e nacional. O acontecimento foi significativo como expressão de um desenvolvimento que também se fez sentir no ensino, com a criação, na mesma época, de cursos jurídicos como o de Olinda, instalado em 1828 no mosteiro de São Bento e em 1854 transferido, já como faculdade, para Recife.

O curso jurídico encontraria, em Recife, condições propícias, de época e lugar, para seu florescimento, sobretudo na segunda metade do século. O movimento intelectual denominado "escola do Recife", por exemplo, nascido na faculdade e com seu desenvolvimento em torno dela, foi episódio que exerceu influência profunda na cultura brasileira.

Durante a regência, ocorreu em Recife, como também no Maranhão, uma rebelião chamada setembrada ou setembrizada, cujos antecedentes estavam ligados ao partido dito regressista, composto, na maioria, de portugueses partidários do regresso de Pedro I, para formar, ao norte do Brasil, novo reino, que seria chamado Império do Equador, Império do Amazonas ou, ainda, Império do Rio São Francisco. O espírito de sedição apoderara-se das províncias e favorecia atentados. Em setembro de 1831, a cidade, durante dois dias, esteve entregue à desordem.

Os regressistas igualmente provocaram a abrilada e a cabanada ou guerra dos cabanos, na expectativa da volta de Pedro I ao Brasil. A prisão dos implicados na setembrada, enviados para Fernando de Noronha, deixou Recife sem sua guarnição, que era substituída, nos domingos e dias santificados, pelos batalhões de milícia. Uma dessas unidades, quase toda composta de portugueses, abandonou os postos e seguiu, em companhia de outros elementos armados, para o bairro portuário, onde iniciou, a 14 de abril de 1832, a abrilada, movimento que, liquidado em Recife pelos pernambucanos, tentou manter-se no interior, nas matas de Jacuípe e Panelas.

O governo de Francisco do Rego Barros, conde da Boa Vista, entre 1838 e 1844, impulsionou o desenvolvimento da província, depois de sufocados os movimentos regressistas. Incluem-se entre suas principais realizações a construção do palácio do governo, sobre alicerces do antigo palácio de Friburgo, a do teatro Santa Isabel e a da antiga ponte pênsil do Capibaribe, em Caxangá, única do gênero até então no Brasil; o serviço de abastecimento de água potável da capital; e estradas de rodagem de enorme importância para as comunicações entre a capital e o interior.

A atuação de Rego Barros como presidente de Pernambuco marcou época na história da província. À frente do governo durante sete anos, com ligeira interrupção em 1841 (caso quase único no império), conseguiu resultados que administrações anteriores não poderiam alcançar. Recife remodelou-se com suas iniciativas urbanísticas e notáveis construções. De sua permanência em Paris, Rego Barros não apenas guardou as maneiras de um autêntico grand seigneur da restauração, como trouxe, para oportuna utilização em seu governo, planos e idéias avançadas.

O ano de 1848 assinalou, no império, a retomada do poder pelos conservadores, depois de quatro anos e oito meses de predomínio liberal. A intransigência política dos novos governantes, a anulação de eleições senatoriais e, no plano regional, o afastamento em massa de funcionários públicos e a resistência à oligarquia dos Cavalcanti-Rego Barros foram o ambiente político-partidário determinante da chamada revolução Praieira (revolta dos "praieiros", assim denominados por se unirem numa casa da rua da Praia), em Recife.

Em 1872, assumiu o governo de Pernambuco Henrique Pereira de Lucena (barão de Lucena), amigo do conselheiro João Alfredo Correia de Oliveira, então ministro do Império. Lucena restaurou as finanças da província e executou um programa de melhoramentos públicos em Recife e no interior. Paralelamente, enfrentou a agitação política decorrente da Questão Religiosa, suscitada entre D. Vital Maria Gonçalves de Oliveira, bispo de Olinda, e a maçonaria unida às irmandades religiosas.

Depois de vários distúrbios orientados por dirigentes populares, instaurou-se processo-crime contra o bispo, preso em Recife em janeiro de 1874, transferido para o Rio de Janeiro, julgado pelo Supremo Tribunal de Justiça e condenado a quatro anos de prisão com trabalhos forçados, para ser afinal anistiado por Pedro II, em 1875.

O fato de os revolucionários de 1817 e 1824 terem sido partidários da extinção da escravatura indica a precocidade das idéias abolicionistas em Pernambuco. Para defendê-las, apareceram sociedades emancipadoras em Recife e na zona dos canaviais (Nazaré da Mata, Quipapá, sobretudo Goiana, onde a abolição ocorreu em abril de 1888), até mesmo na zona pastoril (Salgueiro). Todas essas sociedades fundiram-se, de forma direta ou indireta, no Clube do Cupim -- antes chamado Relâmpago, para mostrar a rapidez dos seus processos --, criado, em 1884, pelo guarda-livros João Ramos, que logo desenvolveu trabalho objetivo e contínuo, promoveu a fuga de escravos, ocultou-os em Recife (a costureira Leonor Porto ficou conhecida por prover-lhes essa espécie de asilo) e mandou-os livres para o Rio Grande do Norte (Moçoró) e o Ceará.

Em 1871, passou a vigorar a lei provincial que determinava a participação do governo na campanha, pois o autorizava a despender dinheiro na compra de cartas de alforria. De 1879 em diante, Joaquim Nabuco, com ressonâncias nacionais, imprimiu notável impulso à campanha, e lutou, na imprensa e nos comícios, para vê-la triunfante ao lado de José Mariano Carneiro da Cunha, Maciel Pinheiro, Aníbal Falcão, Belarmino Carneiro e outros, estudantes, oradores populares e jornalistas.

Em 1883, organizou-se a Comissão Emancipadora do Recife, integrada por Tobias Barreto, Artur Orlando, João Barbalho, Paula Batista, Barros Sobrinho, Brás Florentino, José Vasconcelos, Figueiroa de Faria, Gomes de Matos e Barros Guimarães. A imprensa, com a liderança do Diário de Pernambuco, do Jornal do Recife e A Província, contribuiu aplicadamente para o êxito da causa abolicionista.

República. Com a proclamação da república, assumiu o governo de Pernambuco o coronel José de Cerqueira Aguiar Lima, comandante das armas. Começou a influir o pequeno partido dos republicanos históricos, liderados por José Isidoro Martins Júnior e Ambrósio Machado da Cunha Cavalcanti. A partir da posse do governador efetivo, brigadeiro José Simeão de Oliveira, em 12 de dezembro de 1889, a influência passou ao antigo Partido Liberal, agora Partido Democrata, chefiado por José Mariano Carneiro da Cunha e José Maria de Albuquerque Melo. Criou-se logo uma situação desfavorável ao brigadeiro Simeão, cuja atuação desagradou aos republicanos históricos e ao Partido Conservador, dirigido por Francisco de Assis da Rosa e Silva, João Alfredo e Antônio João do Amorim, barão de Casa Forte.

Em 1890, o barão de Lucena conseguiu de Deodoro o afastamento de José Simeão e a nomeação do candidato de Martins Júnior, Albino Meira, que passou apenas três meses no poder. Foi substituído, em julho, por Ambrósio Machado, outro republicano histórico. Lucena esforçou-se por conseguir a harmonia dos partidos, e voltou à presidência da província. Com o início de sua nova administração, em agosto de 1890, o novo regime consolidou-se em Pernambuco.

Floriano Peixoto indicou para governar Pernambuco o capitão Alexandre José Barbosa Lima. A indicação foi ratificada pelo congresso estadual. Martins Júnior rompeu com Barbosa Lima, que procurou o apoio dos "democratas". A crise evoluiu para uma moção de desconfiança votada pelo congresso estadual. Barbosa Lima, intimado a deixar o poder, respondeu com o fechamento das câmaras municipais e motivou motins no interior do estado.

Quando irrompeu a revolta da armada, no Rio de Janeiro, José Mariano Carneiro da Cunha e José Maria de Albuquerque Melo pensaram numa intervenção armada que segregasse o norte, para obrigar Custódio de Melo a depor as armas e Floriano a um acordo que permitisse sua substituição por um civil, mediante reforma constitucional. A idéia acabaria por incompatibilizá-los com o situacionismo, não obstante a promessa de apoio de Barbosa Lima, atraído por Aníbal Falcão.

Fracassado o movimento, na véspera de sua deflagração, ocorreram em Pernambuco a prisão de seus líderes, a suspensão de A Província, jornal de José Mariano e José Maria -- o primeiro foi preso e o segundo assassinado -- e o fuzilamento de militares. A partir de 1894, Barbosa Lima comandou medidas de grande repercussão na economia do estado, com programas de incentivo às atividades das agroindústrias açucareira e têxtil.

Ainda nessa fase, formou-se no estado a força política do "rosismo", representada pelo conselheiro Francisco de Assis da Rosa e Silva que, eleito vice-presidente da república, chegou a substituir Campos Sales, em certo período, o que aumentou ainda mais sua influência em Pernambuco.

Com a ascensão de Hermes da Fonseca, o general Emídio Dantas Barreto, pernambucano, então ministro da Guerra, foi escolhido para concorrer ao posto de governador do estado. A campanha a seu favor foi chamada de "salvação". Rosa e Silva decidiu apresentar-se como candidato. Verificaram-se perturbações sucessivas em Recife, Herculano Bandeira de Melo renunciou ao governo em setembro de 1911, para apressar a eleição e diminuiu, com isso, o tempo de propaganda dos adversários.

Estácio de Albuquerque Coimbra, presidente da Câmara dos Deputados, foi o substituto de Bandeira de Melo. Antecipou-se o pleito para 5 de novembro. Cada uma das facções deu como vencedor seu candidato, sob a acusação de fraude da corrente contrária. O governador interino deixou o posto em 10 de dezembro, o congresso estadual proclamou governador o general Dantas Barreto e encerrou-se o domínio rosista, que se prolongara por 25 anos.

O governador seguinte, Manuel Antônio Pereira Borba, caracterizou-se pela austeridade administrativa, independência de atitudes e insubmissão às interferências de Dantas Barreto, que o indicara. Durante a sucessão, ocorreram hostilidades entre "borbistas" e "dantistas", suspensas, em 1919, com a eleição do candidato de Borba, José Rufino Bezerra Cavalcanti, cuja morte, em 1922, provocou uma crise política no estado.

O governo federal, sob a presidência de Epitácio Pessoa, chegou a concentrar forças em Recife, mas foi feito um acordo político, de que resultou a escolha de Sérgio Teixeira Lins de Barros Loreto. Foram de seu governo a construção do Departamento de Saúde e Assistência, o quartel do Derby, cujo local passou por extraordinária transformação e ajardinamento das áreas adjacentes, a construção da avenida Beira-Mar em Boa Viagem e do palácio da Justiça, assim como a dragagem e reaparelhamento do porto de Recife.

A assistência à saúde pública representou, no entanto, a parte mais importante do governo Sérgio Loreto. Entregue ao jovem sanitarista Amauri de Medeiros, contou com a fundação de hospitais, postos e dispensários, com o exercício da medicina preventiva e muitas medidas que antecipavam, na região, modernos métodos de defesa da saúde popular.

Em 1926, depois de haver exercido a vice-presidência da república, Estácio Coimbra assumiu o governo de Pernambuco. Entre os aspectos mais importantes de sua administração, inclui-se a criação de uma inspetoria de monumentos, da Diretoria Técnica da Educação, dentro da reforma de ensino Carneiro Leão, e do Serviço de Higiene Social. Registre-se, ainda, a obra do sanitarista Gouveia de Barros, que defendeu Recife da febre amarela, que grassava então em várias outras capitais brasileiras.

Revolução de 1930. Depois do assassínio, em Recife, do presidente João Pessoa, indicado para vice-presidente da república na chapa encabeçada por Getúlio Vargas, formou-se ampla frente de militares e civis contra as correntes situacionistas, com a expansão de importantes núcleos de conspiração. Dada a enorme repercussão do crime em todo o país, generalizou-se o sentimento de revolta contra as forças dominantes, acusadas de coniventes com os responsáveis pela tragédia.

Em Pernambuco, a oposição, chefiada por Carlos de Lima Cavalcanti, de grande prestígio popular, proprietário do Diário da Manhã e do Diário da Tarde, dois importantes jornais de Recife, articulou-se com o comando militar da revolução no Norte, confiado ao então tenente Juarez Távora. A 3 de outubro começou a revolução, cuja vitória ocorreu em Recife, no dia 5, com a rendição do governador Estácio Coimbra. Carlos de Lima Cavalcanti foi nomeado interventor federal e em 1934 eleito governador pela assembléia. Permaneceu no cargo até 1937, quando Agamenon Magalhães assumiu a interventoria, após a instalação do Estado Novo, e por quase oito anos administrou o estado com severa autoridade, voltado para atividades econômicas.

Depois do Estado Novo. Na administração do governador Alexandre José Barbosa Lima Sobrinho (de 1948 a 1951), realizaram-se grandes obras de pavimentação e urbanização de Recife, construção de pontes e da grande estação rodoviária da capital. Inauguraram-se a Faculdade de Filosofia, posteriormente incorporada à Universidade Federal de Pernambuco, e a Escola Superior de Veterinária, abriram-se rodovias e criaram-se escolas, hospitais, postos de puericultura etc., no interior do estado.

Em 1951, Agamenon Magalhães retornou ao poder como governador constitucional, mas morreu em agosto de 1952 e, para completar o quadriênio, foi escolhido como candidato de conciliação Etelvino Lins de Albuquerque, eleito governador por decisão das principais correntes partidárias do estado. Dentre as obras que levou a efeito contam-se a pavimentação de rodovias, o saneamento e abastecimento d'água em cidades do interior, alargamento da avenida Conde da Boa Vista, criação de ginásios e grupos escolares.

Durante o quatriênio do general Osvaldo Cordeiro de Farias (de 1955 a 1959), os proprietários de terra e os industriais, em protesto contra as providências para a criação do novo código tributário, que implicaria aumento de impostos, ameaçaram o governo com represálias e fizeram deflagrar greve geral de 48 horas em Recife. O governador decidiu nomear uma comissão de técnicos e juristas para estudar o projeto-lei que havia sido aprovado pela Assembléia Legislativa. Essa resistência serviu de apoio à campanha que levou ao governo o engenheiro Cid Feijó Sampaio, cujo programa administrativo foi consagrado à industrialização, representada especialmente pela criação do Distrito Industrial do Cabo.

História recente. Em Pernambuco, apesar do afluxo de recursos da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), órgão com sede em Recife, os últimos anos da década de 1950 e primeiros da de 1960 foram um período de agravamento das tensões sociais, criadas pelo quadro de latifundiarismo, e de agitação político-social. O clima reformista teve sua expressão mais clara nas Ligas Camponesas, que, criadas por Francisco Julião, tinham por objetivo a reforma agrária e a concessão de direitos trabalhistas ao homem do campo, e também na atuação do líder político Gregório Bezerra. Ao mesmo tempo, o governador Miguel Arraes de Alencar, eleito pelo Partido Social Trabalhista, passou a realizar um programa voltado para os interesses populares e de apoio às reformas de base. Em face de sua incompatibilidade com a orientação do movimento militar de 1964, Arraes foi afastado do poder e teve seus direitos políticos cassados. O poder passou para o vice-governador Paulo Pessoa Guerra, cujas divergências com Arraes eram notórias.

A eletrificação rural, a irrigação de terras sertanejas, propiciando culturas de alto rendimento, e a pavimentação de rodovias marcaram o governo de Nilo Coelho, o primeiro governador eleito indiretamente, pela Assembléia Legislativa, depois de 1964. A política de incentivos fiscais, levada a cabo pelo regime militar na década de 1970, permitiu aos sucessivos governos estaduais, nesse período, realizar investimentos na agrindústria do açúcar. Além disso tomaram-se medidas para modernizar o setor industrial, com destaque para o segmento têxtil. Em 1980, os trabalhadores agrícolas da zona canavieira organizaram a primeira greve desde o golpe de 1964. Aderiram ao movimento 144.000 trabalhadores.

No ano seguinte, avolumaram-se graves denúncias originadas da crescente preocupação ecológica, em particular sobre a poluição dos rios pela indústria do álcool. Em 1982 uma medida de caráter internacional distinguira Pernambuco: a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (unesco) conferiu a Olinda, como já fizera com Ouro Preto, o título de "patrimônio cultural da humanidade". A cidade obteve, assim, recursos para a restauração de seu centro histórico.

Em 15 de março de 1987, Miguel Arraes voltou ao palácio das Princesas pelo voto popular, 23 anos após ter sido deposto. Em seu novo mandato, elevou o piso salarial dos servidores públicos, empreendeu reforma administrativa, recuperou hospitais, combateu o déficit habitacional com a construção de casas populares e propôs-se reverter, na área agrícola, a desfavorável situação pela qual o estado importava, ainda, 70% do que consumia.

Em outubro de 1988, de acordo com a determinação da Assembléia Nacional Constituinte o estado incorporou a seu território, como distrito estadual, arquipélago de Fernando de Noronha. Em 1994, Miguel Arraes pela terceira vez foi eleito governador, com a preferência de mais de cinqüenta por cento do eleitorado. Em meados da década de 1990 várias empresas industriais tomaram a decisão de se instalar no estado.